A atual greve das IFES, no âmbito da UnB, traz no seu desenvolvimento alguns elementos que a diferenciam de movimentos ocorridos no passado:
- A motivação não é por simples aumento salarial, porém pela estruturação da carreira funcional (que refletirá, por certo, nos contra-cheques); ou seja a negociação é mais abrangente e não poderá ser traduzida em termos de ajustes numéricos e percentuais, coisa que o governo não está habituado a fazer.
- A adesão nacional tem sido bastante significativa e efetiva.
- A imprensa local tem reconhecido a justeza das reivindicações e soltado notas favoráveis ao movimento (veja post aqui sobre isso).
- O Diretório Central dos Estudantes se manifestou contrário ao movimento grevista (cf. nota divulgada em 21/05).
- Segmentos da UnB desfavoráveis à greve chegaram a se manisfestar contra o movimento alegando que é hora de "apoiar o governo" (sic) (cf. carta da Prof. Ana Valente divulgada pela Adunb em 18/05).
- O Conselho de Pesquisa e Ensino e Extensão (CEPE) da UnB, supostamente, reconheceu a greve e garantiu a reposição dos dias parados (cf. nota no portal da UnB em 31/05).
A decisão do CEPE e a correspondente divulgação pelo veículo oficial da instituição teve efeito catalizador quase que imediato com os professores que ainda estavam decidindo quanto à adesão ao movimento. Pela leitura da nota da Secretaria de Comunicação (Secom), nada valeria um professor continuar com suas atividades de sala de aula, posto que qualquer aluno que se sentisse prejudicado por algum fato ocorrido (fata, atividade avaliativa etc.) em sala durante o período da greve teria direito à reposição integral da atividade sem ônus retroativo. Muitos colegas se sentiram impingidos à paralisar as aulas para não serem obrigados a duplicar esforços.
É importante frisar que uma, suposta, reposição forçada das aulas poderá esbarrar em questões trabalhistas importantes relacionadas às férias dos docentes, posto que o Decanato de Gestão de Pessoas (DGP) não tem permitido o acúmulo de férias vencidas e não usufruídas. Como (ainda de acordo com a nota da Secom de 31/05) a paralisação restringe-se às aulas é lícito supor que TODOS os professores que estão no regime de Dedicação Exclusiva continuam com as demais atividades que desempenham no âmbito da UnB: pesquisa, extensão, orientação e, em alguns casos, administração e terão direito às férias anuais regulamentares. Posso garantir que alguns colegas, mesmo sem ter dado aulas desde a divulgação da nota da Secom, têm desenvolvido todas as demais atividades extrema dedicação e deverão, salvo orientação contrária do DGP, ter que iniciar o usufruto das de férias em algum momento antes de 31/dez deste ano (dependendo do caso elas podem se estender até 13/fev/2013). Isso significa que um eventual ajuste de calendário (para o período 01/2012 e/ou 02/2012) estará comprometido, pois,
- ou o professor entra em sala de aula estando em férias (o que é ilegal, mas que ocorreu com vários colegas em jan/2011),
- ou as aulas previstas para aquele período não serão efetivamente dadas (o que também é ilegal),
- ou o DGP permite o acúmulo de férias, ou a venda de parte delas, para muitos docentes (o que é legal, porém não praticado pela instituição),
- ou a UnB contratará professores substitutos para os meses de férias dos docentes (além de não ser prática aplicada aqui, a qualidade das aulas, sem dúvida, iria para o ralo).
A mencionada nota da Secon causou em muitos colegas a falsa impressão de que o calendário acadêmico fora suspenso, o que não é verdade, posto que a única coisa suspensa é a data final do mesmo. Isso significa que, legalmente, até o momento, todas as datas previstas no calendário, (à exceção do término) continuam válidas. A nota da Secon, serviu para agradar aos segmentos favoráveis à greve (aspecto importante em um ano de eleições para a Reitoria) sem comprometer, do ponto de vista jurídico, a administração da UnB com a paralisação das aulas (aspecto importante em um ano de eleições regionais nacionais).
Qualquer aluno da disciplina "Diplomática e Tipologia Documental" do curso de Arquivologia da UnB sabe o bê-a-bá das relações existentes entre as decisões administrativas e os documentos normativos que formalizam tais decisões. O documento final, aquele com plenas condições de provocar ações administrativas (Cf. DURANTI, 1986), não é a nota da Secon e nem a ata da reunião do CEPE, porém o documento normativo feito a partir daquele evento, no caso, uma RESOLUÇÃO.
A
Resolução 138/2012, de 01/jun não normatiza absolutamente nada em relação à reposição de aulas ou a supostos direitos que os alunos teriam de recorrer de notas e faltas relativas ao período da greve. A resolução tem apenas dois tópicos:
- um que reconhece o movimento grevista (NÃO reconhece, portanto, estado de greve) e deixa a data final do calendário acadêmico em aberto;
- outro que cria uma comissão para acompanhamento da qualidade de ensino durante o período da greve (mais um indicativo que que as atividades de ensino continuam durante a greve, pois há algo a ser acompanhado).
Longe de impulsionar o movimento grevista a mencionada resolução ampara os professores que optarem por dar continuidade às aulas, não assegurando aos alunos faltosos nenhum direito quanto à reposição de aulas já dadas. Pela mesma base normativa, todas as atividades avaliativas aplicadas no período poderão ser computadas, de acordo com o já estabelecido no plano de ensino, não estando o docente obrigado a reaplicação das mesmas. A Resolução 138/2012 não apenas garante a continuidade das aulas como também estabelece mecanismo para o acompanhamento da qualidade das mesmas, conforme disposto no seu artigo 2º.
A análise diplomática é capaz de expor as divergências entre o discurso e a prática efetiva, entre a leitura que se tentou estimular no portal da Secom e a atitude efetiva, expressa no documento normativo.
As aulas previstas para esta semana estão mantidas. Na ocasião conversaremos abertamente sobre nossas atividades durante a greve, buscando uma solução coletiva (professor-alunos) para o momento atual. Isso significa que:
- a aula de Diplomática e Tipologia Documental, para a graduação está mantida para esta 6ªf, 15/06 no CEDOC/UnB, às 19hs.;
- a aula de Metodologia para a pós-graduação está mantida para esta 5ªf, 14/06, às 14hs na FCI;
- todas as atividades avaliativas solicitadas até lá deverão estar concluídas.
Proposta de atividade optativa surpresa:
Veja
aqui relação de posts anteriores sobre a UnB.
André Lopez